sexta-feira, junho 18, 2010

Para sempre, José Saramago!

Foto: Saramago em Lanzarote (Espanha), por Sebastião Salgado.



Sabe aquelas pessoas que a gente acha que nunca devem morrer? Para mim, José Saramago era uma dessas pessoas. Podem achar exagero, mas a notícia da morte dele me deixou arrasada. Guardadas as devidas proporções, depois da morte do meu pai, cinco anos atrás, não consigo lembrar quando fiquei tão triste assim pela morte de alguém. Poucos dias atrás iniciei a leitura da biografia dele, escrita por João Marques Lopes, e lembrei que biografias geralmente se lê quando o biografado já faleceu...Na hora, deu um alívio saber que não era o caso do Saramago.

O primeiro livro dele que li foi “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”. Fui criada na religião Católica, já li todo o Novo Testamento e vários livros do Velho Testamento e, ainda assim, não achei que a obra era uma heresia, como ouvi de muita gente. Soube que na época do lançamento da obra, ele foi quase obrigada a sair de Portugal e passou a viver na Espanha. Na verdade, achei o livro bem engraçado e gostei muito de poder conhecer um outro ponto de vista sobre uma história que nos é contada sempre da mesma forma.

Aliás, essa outra maneira de “ver o mundo” é o que mais me fascina nas obras de José Saramago. Sem pudores, ele descreve o ser humano nas situações mais baixas possíveis e com todas as suas fraquezas, mesquinharias e crueldades. E faz isso no melhor estilo “cômico se não fosse trágico”. Foi assim em Ensaios sobre a Cegueira, até agora meu livro preferido dele. Até agora porque ainda não li toda sua obra. Lembro que na primeira parte do livro, eu me acabava de rir das situações e na segunda parte, eu só chorava. É uma obra sem igual. Quem convivia comigo na época sabe o quanto fiquei feliz quando soube que Fernando Meirelles ia fazer a versão do filme para o cinema. Eu tinha certeza que o filme seria ótimo, como foi. O próprio Saramago elogiou. Logo ele, tão difícil de agradar...

Depois li “As intermitências da morte”, pra mim a obra mais engraçada dele. E a mais irônica. Mais uma vez, me impressionou a sua fantástica imaginação e o fato de refletir sobre algo que nós, as pessoas comuns, nem chegamos a cogitar: o que aconteceria se ninguém mais morresse? E se a morte mandasse um aviso, por meio de carta, de que está próxima? Imperdível. Infelizmente, por causa dessas coisas da vida, perdi esse livro. Quando quiser lê-lo novamente, as livrarias estão aí para vender livros, rs. A Cultura tem uma seção maravilhosa, que fica quase no meio da loja, com uma mesa, com várias obras dele.

O quarto livro foi O Homem Duplicado, outra ficção sem igual. O cara solteiro, morando sozinho, aluga um filme e, de repente, vê que é a cara de um dos atores do filme. Intrigante e final surpreendente. O quinto livro foi “A viagem do Elefante”, até agora o que gostei menos, mas que não deixa de ser um bom livro. A última obra que li foi O Conto da Ilha Desconhecida. Lúdico.

Enfim, o mundo está mais chato. Mesmo aos 87 anos, José Saramago ainda produzia muito. E era uma felicidade saber que ele ainda estava por aí, escrevendo alguma história fantástica que ia me deixar boba de novo. É realmente muito triste saber que um dos melhores escritores de todos os tempos, na minha modesta opinião, não está mais entre nós. E não posso dizer “Vá com Deus”, porque ele não gostaria, mas espero realmente que ele esteja em um bom lugar.